quinta-feira, 5 de julho de 2012

Ascenção ao Pisco Oeste





Glossário

Piqueta: pequena picareta destinada a auxiliar a progressão e segurança do alpinista/escalador sobre pendentes de neve, ou gelo. Existem duas grandes categorias de piquetas, ou piolets, os de Marcha, e os Técnicos. Os primeiros indicados para ascensões de pendentes suaves, os segundos com uma variedade e especificidade de características são indicados para escalada de pendentes bastante pronunciados e para a escalada de cascatas, ou seja em planos verticais.

Grampão: Peça metálica com saliências pontiagudas (8, 10 ou 12 pontas), que se coloca através de fitas ou sistemas automáticos sob a base das botas de plástico (botas rígidas) e similares (crampons automáticos e semi-automáticos) e de couro, (crampons com fita). São utilizados para caminhar ou escalar sobre alguns tipos de neve, sendo imprescindíveis sobre o gelo horizontal e vertical. Os crampons, sempre utilizados aos pares, são indispensáveis para a progressão de alpinistas e escaladores de cascatas no gelo.

Arriero: condutor de mulas e burros.

Crux: Passo chave, a dificuldade máxima de uma via de escalada.

Glaciar: Grande massa de gelo encontrada em zonas de elevada altitude ou zonas polares. Apesar de aparentemente imóveis, os glaciares em montanha movimentam-se em direção descendente segundo a força da gravidade.

Serac: bloco de gelo de grandes dimensão, fragmentado e gretado, pertencente a um glaciar, e cuja ruptura se deve ao movimento do gelo em zonas de grandes pendentes, que ampliam a largura da montanha.

Gretas: fendas no gelo que se encontram nos glaciares, resultantes das diferentes velocidades de deslocação que sofrem diversas partes do mesmo. São um perigo objetivo para o escalador, pois estão cobertas de camadas de gelo que podem romper-se numa grande armadilha.

Escalada em top-rope: Suspende-se a corda no topo de uma rocha, numa das pontas da corda encorda-se o escalador e, na outra, quem faz a segurança, que fixa uma ancoragem. Escala-se como que em suspensão. Se a pessoa que faz a segurança puxar a corda com força, pode até içar o escalador. Não há quedas de impacto, só de  deslizamento.

Rapel: técnica de descida vertical em corda onde esta é recolhida após à descida de um determinado trecho relativo ao seu tamanho, para ser utilizada numa outra descida.

Cordada: O par de escaladores. Na realidade podem ser mais. No entanto, nas disciplinas da escalada (gelo, rocha, esportiva, etc) as cordadas são normalmente constituídas por duas pessoas. Isto permite uma ascensão mais rápida, todavia mais perigosa em áreas de risco, já que uma terceira pessoa é de extrema importância para solicitar socorro, enquanto o seu companheiro realiza os primeiros socorros e reconforta a(s) vítima(s).

Camelbak: Recipiente em forma de saco com um pequeno tubo, destinado à colocação de líquidos. É normalmente utilizado em pequenas mochilas para as costas, ficando apenas o tubo de fora para uma fácil sucção. A sua utilização é de extrema funcionalidade em esportes em que é necessário realizar uma hidratação ao longo de toda a atividade física, particularmente em esportes outdoor. Usa-se facilmente o tubo para ingerir a água necessária sem perder tempo de parar e retirar o recipiente.

Moraina: Acumulação de pedras e detritos rochosos resultantes do desgaste ocorrido pelo deslocamento de um ou vários glaciares, geralmente antigos e já afastados, em contacto com as superfícies rochosas. As morainas podem ser laterais, quando acumulam pedras na face lateral do glaciar, centrais quando, resultam da confluência de dois glaciares, ou terminais, resultantes do desgaste do relevo existente ao longo do avanço da frente do glaciar.

Quéchua: idioma indígena andino.


Saímos de Huaráz às 06h30 da manhã, 15 min. depois do combinado, numa van levando o guia Epi, que havia nos acompanhado durante o trekking na Cordillera Huayhuash e estava guiando a expedição de um casal de americanos e suas duas filhas para um trekking de 5 dias pela trilha Llaganuco – Cashapampa, e o nosso guia de montanha Messias, juntamente com nós 4: eu, Paulo “Novim” Arenas, Daniel Romero e Larissa Lima. Nosso destino era o acampamento Cebollapampa (3.900 m.s.n.m.) no Parque Nacional Huascarán, ponto de encontro tanto para quem iria escalar os nevados Pisco Oeste e Huandoy, como para quem iniciaria a trilha Llaganuco – Cashapampa ou o trekking para a Laguna 69.

Depois de tomarmos café da manhã em Yungay, cidade mais perto da entrada principal da reserva, entramos no parque e nos dirigimos à portaria do Setor Llaganuco, onde encontramos uma expedição polonesa que, aparentemente, pelas mensagens nas suas camisas, tentaria escalar o Alpamayo. No entanto, provavelmente iriam antes aclimatar no Pisco, pois, mais tarde, os encontraríamos no acampamento-base do Pisco Oeste e do Huandoy.


Pagamos nossa taxa de escalada de S./ 65 cada um e nos dirigimos às Lagunas Llaganuco. Passadas as lagunas logo estacionamos acima de Cebollapampa e descemos os equipamentos da expedição até o acampamento, onde os arrieros, entre eles o Policarpo - Poli -, que também seria nosso cozinheiro, carregaram nossas quatro mulas. Lá também conhecemos o Divúrcio, assistente do guia Messias. Na verdade o Divúrcio tinha praticamente o mesmo conhecimento e habilidades do guia Messias, com a diferença de que não era guia oficialmente certificado pela Associação de Guias de Montanha do Peru.



Começando por volta de 11h00, subimos uma suave porém longa trilha até o acampamento-base, a 4.600 m.s.n.m., em 2h15 min, 45 min a menos do que o previsto por nosso guia. Lá chegando avistamos nosso acampamento praticamente montado, o acampamento de uma expedição alemã, o de uma expedição espanhola, e um francês que ranhetava com os poloneses por terem montado suas barracas muito perto da dele. Além destes, uma expedição francesa nos acompanhou na subida até o acampamento-base.
O Refúgio Perú estava fechado, com previsão para abrir somente alguns dias depois, uma falha da administração do Parque, pois a temporada de escalada já havia começado há algumas semanas. O refúgio poderia nos dar mais conforto, mesmo que tivéssemos que pagar um pouco mais para ficar nele. Os banheiros do acampamento base, na verdade uma casinha dividida em 4 sobre um laje com um buraco em cada uma das suas divisões, era bem precário. Numa delas uma escultura de cocô congelado de algum montanhista ruim de mira pairava na beirada de um dos buracos. Nas outras, era possível ver os amontoados de papéis higiênicos. Na verdade, o banheiro era bem pior do que aqueles que havíamos visto durante o trekking na Cordillera Huayhuash.





Do acampamento-base observávamos o flanco sul e o cume do Pisco Oeste, assim como parte da moraina que se elevava a norte do acampamento e precedia os glaciares da montanha. Aparentemente a subida ao Pisco era uma suave caminhada no glaciar que descia o monte num ângulo de menos de 50°. Tolo engano.
Arrumamos nossas barracas e entramos na barraca cozinha/refeitório para tomarmos chá preto ou mate de coca, líquidos quentes importantes para ajudar na hidratação e aclimatação, e comer pipocas. Depois fomos descansar em nossas barracas.

Por volta das 16h00, Messias e Divúrcio nos acordaram. Nós já havíamos experimentado as botas plásticas em Huaráz, mas os guias queriam se certificar que sabíamos vestir as cadeirinhas, as botas, os grampões e as polainas, assim como dar os nós e usarmos as cordas corretamente. Experimentamos tudo e fomos preparar nossas roupas para a escalada. Jantamos e, antes das 19h00, já estávamos dentro de nossos sacos de dormir esperando a hora de acordar para tentarmos o ataque ao cume.

Pontualmente à meia-noite fomos acordados pelo Messias. Encontramos-nos na barraca refeitório, onde tomamos um breve café da manhã, já que a ansiedade e a altitude nos tiravam a fome. Porém, bebemos muito chá para hidratar e enchemos a garrafa térmica do Paulo com 1 L de leite quente com achocolatado para tomarmos durante a subida. Como eu disse, já havíamos aprendido que na montanha a melhor forma de se alimentar e hidratar era com líquidos quentes.

À 01h00 começamos a subir a primeira parte da moraina. O frio era intenso, mas o esforço fazia com que suássemos dentro de nossas camadas de roupa. Após chegarmos à cumeeira, vimos que a descida do outro lado era bastante íngreme, e tivemos alguma dificuldade para descer. Logo depois começamos uma travessia em blocos soltos de rocha que lembravam ao Paulo, experiente espeleólogo, os blocos abatidos de uma caverna, o que exigia concentração e esforço físico, que ia até a segunda parte da moraina. Subimos em silêncio até chegarmos à beira do glaciar (5.150 m.s.n.m.) às 03h44 da manhã, 16 min. antes do previsto.

Vestimos nossas botas plásticas, polainas, sobreluvas e grampões, escondemos nossas botas de trekking embaixo de algumas rochas, e instalamos nossas cadeirinhas. O guia Messias determinou que o Daniel, o Paulo e a Larissa ficariam na sua cordada, enquanto eu iria encordado com o assistente Divúrcio.

Quando o Messias perguntou ao Divúrcio onde estava meu segundo bastão, este respondeu que “- El bastón del gordo está en su mochila.” Percebi que eu estava encordado sozinho com o Divúrcio porque o guia temia que eu desistisse e tivesse que voltar. Sem demonstrar irritação, perguntei se ele achava melhor eu deixar meu segundo bastão escondido sob as rochas também, e o Divúrcio se tocou que eu entendia bem o que eles falavam. Talvez por isso, depois ele passaram a se comunicar entre si mais em no idioma quéchua. 

Com o Divúrcio liderando, já começamos a subida do glaciar numa pequena escalada em gelo vertical em sentido oeste, tendo que nos familiarizar com as técnicas de encaixar os grampões e piquetas no gelo. Quando se tenta colocar os grampões ou a piqueta no gelo, se este estiver duro os equipamentos se encaixam facilmente, mas, na maioria das vezes encontrávamos gelo fofo e tínhamos que escavá-lo um pouco para encontrarmos gelo mais consistente em que as ferramentas se firmassem melhor.

Pensei: “- O Pisco Oeste é classificado como PD (peu difficile, ou pouco difícil), portanto é uma mera caminhada no glaciar de menos de 50° que eu avistara do acampamento-base; só deve ter esse único lance de escalada em gelo na entrada do glaciar.”

No entanto, a rota de subida não era como eu pensava. O ângulo do glaciar era só uma impressão, já que não subíamos por aquela aparente ladeira. Na verdade, a rota atravessa o esporão e caminha pela face norte. Após chegarmos ao primeiro colo, conhecido como Colo Pisco-Huandoy (5.300 m.s.n.m.) tivemos uma segunda subida de cerca de 60 m em curva num ângulo de mais de 80°, no sentido noroeste. Percebendo minha dificuldade, o Messias me ensinou a segurar o bastão de trekking mais embaixo, fazendo que ele se tornasse um instrumento mais curto como a piqueta, me ajudando melhor a vencer o lance vertical.

O livro que orientara a escolha do Pisco Oeste “Classical Climbs of the Cordillera Blanca” , primeira edição, de 2002, estava desatualizado. As intempéries do tempo haviam modificado bastante a rota do Pisco, devendo agora ser classificado como AD (assez difficile, ou razoavelmente difícil), pelo menos. Segundo o site de montanhismo summitpost.org, desde 2004 o Pisco Oeste é classificado como AD- (AD menos), mas o mesmo site diz que em 2006 não havia escalada em gelo, mesmo na zona de seracs a 5.450 m.s.n.m. No entanto, não vi seracs aparentes. Se ainda existiam, estávamos caminhando por sobre eles.

Pesquisando mais um pouco antes de escrever essa entrada para o blog, descobri que, realmente, essa montanha já foi muito popular por ser fácil. No entanto, a rota primária derreteu significativamente. Como resultado, o Pisco Oeste não demanda a fácil escalada de antigamente e, dependendo da estação, o crux pode ficar com até 60 m de altura, e é estimado que a rota fique mais difícil na medida em que o glaciar for retrocedendo.

Nesse momento, apesar de ter ficado sempre atento a assoprar a água de volta da cânula para dentro da bexiga do Camelbak, percebi que a minha válvula havia congelado, e eu não conseguia mais beber. Isso tinha acontecido com todos os outros, menos com o Daniel, cujo Camelbak não tinha válvula e cuja cânula tinha uma cobertura isolante. Bebi um pouco de água do Daniel economizando bastante.

Nessa hora também aconteceu algo inusitado. O guia que acompanhava um francês passou por nós perguntando se havíamos encontrado um grampão que havia caído do pé do seu cliente. Achamos muito estranho o cara ter perdido o grampão e não ter percebido, pois o gelo estava duro e era muito difícil caminhar pelo glaciar sem grampões. Comecei a achar que o francês tinha perdido o grampão de propósito para não ter que admitir que queria voltar.

Após essa segunda parede, chegamos a outro colo onde avistávamos duas gretas à nossa frente, entremeadas por uma fina ponte de gelo. Não dei muita importância, pois era um tipo de acidente geográfico comum em montanhas, e eu já havia caminhado por uma delas quando subi o Cotopaxi. Na verdade, eu estava mais preocupado com a parede que havia logo depois da ponte de gelo, com ângulo ainda mais vertical do que a parede anterior, mas com uma extensão menor, de cerca de 30 ou 40 m.

Depois de subir sem olhar para trás, tive que parar um pouco para recuperar o fôlego. Atrás de mim apareceu a Larissa, nervosa e preocupada, perguntando ao guia como faríamos para passarmos por aquele trecho na volta. O Messias falou pra ela não se preocupar, pois estávamos com profissionais. Estávamos na rampa sudoeste, que seguia direto para o cume. Enquanto alguém parava para fazer xixi, comi um chocolate e bebi um terço de uma garrafa de Gatorade, ainda preocupado em economizar suprimentos.

Daquele terceiro colo avistávamos três íngremes subidas, cada uma delas seguida por um pequeno platô, mas não avistávamos ainda o crux final, uma quarta subida vertical de 40 m, a única da qual eu tinha conhecimento de sua existência e demanda técnica, portanto me preocupando mais. Após subirmos lentamente duas das três ladeiras finais paramos mais uma vez para tomarmos um pouco de leite morno da garrafa térmica do Paulo. De lá já podíamos avistar o crux final. Eu estava muito cansado e pensei em desistir e voltar, mas o Messias disse que o pior já havia passado, e que em menos de uma hora estaríamos no cume, e nem cogitou em considerar minha desistência.

Passada a terceira subida estávamos na beira da última parede. O Messias subiu primeiro e fez um top rope para os meus três companheiros. Antes do último chegar ao final, o assistente Divúrcio já tinha entrado na parede e eu o segui sem o top rope instalado para mim, tendo que progredir na parede de gelo preso somente às minhas ferramentas ao próprio Divúrcio, o que, na verdade, ajudou na minha concentração e desenvolvimento. Procurava por gelo firme para a piqueta e para os grampões, e sentia o gelo picado envolvendo minha luva e esfriando minha mão direita enquanto afastava o gelo mole do caminho para a parede dura onde pudesse fincar os instrumentos de maneira segura.

Quando o Divúrcio chegou ao final da parede, fincou sua piqueta no gelo para a ancoragem e fez um top rope pra mim, puxando a corda e me ajudando a subir o final do lance vertical. Cheguei ao final avistando meus amigos já no centro do cume. 

Agradeci ao Divúrcio e me juntei aos meus companheiros para tirarmos as fotos do cume de 5.752 m.s.n.m. às 09h00 daquela manhã. O atrativo principal do Pisco Oeste é ter uma vista de 360° de todas as montanhas em volta, sendo muito cênico. No entanto a neblina cobria o cume e mal pudemos ver as montanhas, a não ser aquelas ao norte.


 O grupo de alemães perguntou de onde éramos, ficando muito surpresos quando respondemos, e disseram que deveríamos estar na praia. Na verdade nos sentíamos fracos amadores diante deles, que estavam soberbamente equipados, porém sem exagero, e demonstraram muita técnica na descida do cume.

Aliás, a descida começava a nos preocupar, pois o cume era somente metade do caminho, enquanto a descida era a parte mais perigosa, quando estávamos mais cansados e mais propensos a acidentes.

O Messias montou a ancoragem e rapelamos a descida do cume. O Divúrcio me orientou a como pisar com os grampões na descida das ladeiras de gelo e eu segui na frente, com ele fazendo minha segurança.

Depois de algum tempo, chegamos no próximo trecho vertical. O Divúrcio fez a ancoragem com sua piqueta e eu fiz o rapel descendo lentamente, já que atrás de mim havia no fim da descida um platô de cerca de 6m2 que precedia a ponte de gelo ladeada por duas grandes gretas. Se eu me desviasse um pouco para a direita ou esquerda poderia acabar entrando em uma delas, de modo que eu descia olhando pra trás e me posicionado bem no meio.

Cheguei ao platô e me coloquei bem no centro dele, liberando a corda para o próximo. A Larissa foi a primeira a chegar, atravessando aquele trecho que a tinha deixado muito preocupada algumas horas antes. Ela, a mais forte de nós três, chegou chorando dizendo que estava com muito medo, o que me fez lembrar que apesar de ser a mais durona do grupo, era mulher. Eu também estava com medo, mas nessas horas o medo é nosso aliado e nos ajuda a nos concentrar e a fazer as coisas com calma e atenção. Pedi a ela que fincasse sua piqueta no gelo, sentasse e colocasse o mosquetão da sua cadeirinha na alça da piqueta, de modo que ela ficasse segura.

O próximo a descer foi o Daniel e depois dele o Divúrcio chegou antes do Paulo e do Messias para fazer minha segurança na travessia da ponte, pois já havia muita gente naquele pequeno platô e a hora avançada deixava o gelo mais mole. Depois o Daniel me disse que escutara um estalo enquanto atravessava a ponte de gelo. De qualquer forma é importante frisar que o Paulo, por sua vez, achou tudo muito normal, encarando a descida sem maiores emoções.

Atravessei a ponte de gelo e rapelei a parede em curva, ficando consciente de outra grande fenda que eu não havia percebido ou que não estava aparente durante a subida.


Depois a descida ficou mais tranquila, mas eu andava lentamente, pois estava muito cansado e não queria cometer nenhum erro. A cordada do Messias nos passou, mas em breve já estávamos no último lance vertical antes da moraina e me juntei aos meus amigos, que já desinstalavam seus equipamentos de gelo, por volta das 12h00.



Descemos a primeira parte da moraina passando pelo Acampamento Moraina (4.900 m.s.n.m.), local usado para se acostumar com a altitude por quem não estava tão bem aclimatado como nós, atravessamos o trabalhoso trecho de rochas soltas e chegamos à íngreme subida que precedia a segunda parte da moraina. Após vencermos este trecho só nos faltava uma pequena descida pela trilha na moraina. Felizes, chegamos ao acampamento-base às 14h30, após mais de 13 horas de atividade física ininterrupta.

Os Impermeáveis:

Paulo Arenas

Rodrigo Bulhões

Larissa Lima

Daniel Romero

Fotos: Paulo Arenas(1, 2, 3, 4, 6, 8, 14, 15, 16, 17), Larissa Lima (10), Rodrigo Bulhões (7, 9, 12, 13)

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Alpinismo ou Andinismo? A verdade sobre os primeiros montanhistas

Vulcão Misti (5.822 m), Arequipa, Peru


Eu comecei a me interessar por montanhismo após ler o livro "No Ar Rarefeito", do John Krakauer, sobre a tragédia ocorrida no Everest em 1996, quando várias pessoas morreram e ficaram feridas por causa de um súbito mau tempo. A partir daí, passei a estudar um pouco do assunto.

A renascença trouxe ao homem europeu o interesse em explorar o planeta. Primeiramente interessados em viagens, natureza e montanhas, e mais tarde em montanhismo. O rei Pedro III de Aragão subiu o monte Canigou (2.785 m) nos Pirineus no fim do século XIII. Petrarch escalou o monte Ventoux (1.912 m) no sul da França em 1336. Usando aparatos mecânicos, Antoine de Ville conquistou o pico do monte Aiguille (2.097 m), na França, em 1492, ano do descobrimento da América. No entanto, o montanhismo alpino propriamente dito começou somente depois de Balmat escalar o Mont Blanc em 1786.

Mas durante todos estes períodos e até mesmo antes do nascimento desse misto de esporte com aventura, orgulho dos europeus, os indígenas dos Andes, sob liderança Inca e até pré-incaica, subiram muitas montanhas altas, pelo menos até o momento da conquista espanhola. Mesmo com falta de equipamentos e ferramentas, eles escalaram por sobre neve, gelo, rocha e lava até cumes com mais de 6.700 m, uma altitude que somente seria superada por escaladores modernos em 1855, quando os irmãos Schlagintweits alcançaram o pico do Abi Gamin no Himalaia.

As dificuldades técnicas provavelmente forçaram os antigos incas - fossem quais fossem suas razões para escalar - a limitarem-se quase que totalmente - quase - a picos rochosos, a maioria provavelmente vulcões. Os registros disponíveis indicam que eles escalaram com mais frequência no canto sudoeste do Peru, a única região árida o suficiente para preservar registros de chegada a cumes. Muito provavelmente eles escalaram algumas das cordilheiras orientais e do norte do Peru, mas não existem provas remanescentes.

No sudoeste do atual Peru pode-se encontrar as melhores provas de evidências cerimoniais e religiosas e até de instintos esportivos dos antigos. De acordo com restos mantidos na mina de Cailloma, um enterro Inca ocorreu no cume do Chachani (6.075 m), fato confirmado por um alemão de sobrenome Wagner, que em 1901 liderou três dias de escavações nesse cume para descobrir que o túmulo estava quase completamente saqueado (CONWAY, Sir Martin, 1901. "The Bolivian Andes", pp. 56-57. Londres).

Restos de muros de pedra ainda podem ser encontrados nas arestas do cume do Sara Sara (5.453 m). Alguns objetos de cobre também foram encontrados em suas encostas em 1941. O famoso vulcão Misti (5.822 m), que serve de cenário de pano de fundo da cidade peruana de Arequipa, também exibe construções similares. No ano de 1677, o padre dominicano Alvaro Meléndez escalou seu cume e achou entre as duas crateras traços de uma pequena casa e uma trouxa de lenha. Um viajante peruano que subiu ao mesmo ponto em 1878 constatou que as pedras para a construção da casa haviam sido trazidas de um local bem abaixo. Quando pediu uma explicação a seus carregadores indígenas sobre estes restos incas, um deles creditou o fato ao Demônio (RONDÓN, Enrique, 1937. "Expedición al Volcán Misti", pp. 42-44). Outra montanha perto dali, o Pichu Pichu (5.664 m), contém não apenas construções em vários de seus cumes, como também escadarias acima de 5.300 m, facilitando um trecho de rocha escarpada.

Mas não só no Peru foram encontradas evidências de escaladas incas. Alguns vulcões ainda mais altos do Chile e da Argentina guardam ricos tesouros. Construções de pedra e áreas cercadas para lhamas e alpacas - animais de carga e para sacrifícios - foram localizadas a 6.600 m no Llullaillaco.

Vulcão Llullaillaco (6.739 m), Argentina/Chile



Os três cadáveres mumificados e congelados com aproximadamente 500 anos de antiguidade, descobertos entre 17 e 20 de março de 1999 no vulcão Llullaillaco, entre as províncias de Salta, na Argentina, e Antofagasta, no Chile, são conhecidos como Múmias de Lullaillaco. Os cadáveres são de uma adolescente de 15 anos, conhecida como La Doncela, uma menina de 6 anos, conhecida como La Niña del Rayo, e um menino de 7 anos. A tumba principal se localizava a 6.715 m., o ponto mais alto onde tais evidências foram encontradas.

La Doncela



Múmias ricamente decoradas e ornamentadas com objetos de prata e ouro foram descobertas em outros três cumes de altas montanhas das redondezas. Muitos se perguntam se os incas também se aventuraram no Aconcágua (6.960 m), o ponto mais alto do Novo Mundo. Nenhum traço incaico foi encontrado no seu cume até hoje, mas, como se trata de uma escalada sem dificuldade técnica, muitos especulam sobre o fato, principalmente por ter sido encontrado o corpo de um guanaco, animal parente da lhama e da alpaca, pouco abaixo do cume (para descrições detalhadas de montanhismo inca, consulte os seguintes títulos: ECHEVARRIA, Evelio, 1968. "The South American Indian as a Pioneer Alpinist". Alpine Journal 73 (2):81-88 e "Los Indios Andinos Precursores del Alpinismo". Revista Andina (90): 25-26. Também, FANTIN, Mario, 1969. "A Settemila Metri: Gli Inca Precursori d'Alpinismo". Bologna.).

Estas atividades foram descobertas muito recentemente, já que não foi antes dos anos 1950 que escaladores de origem européia começaram a ficar cientes de que os incas os precederam nos cumes andinos em pelo menos quatro séculos. Inúmeras evidências são totalmente possíveis de serem achadas no sudoeste peruano, particularmente em vulcões altos situados perto de ruínas incas ou seções do famoso Caminho Inca.

Dessa forma, fica mais do que provado que o montanhismo em si começou con os incas nos Andes. Eles ainda não o encaravam como esporte de aventura propriamente dito como o concebemos hoje, mas subiram montanhas bem altas. Por isso que o sinônimo alpinismo, derivado dos Alpes europeus, é uma impropriedade. O esporte deveria ser chamar Andinismo.

Boas trilhas!

Bulha

Bibliografia:

RICKER, John F. Yuraq Janka: Guide to the Peruvian Andes Part I - Cordilleras Blanca and Rosko. 2nd edition. Alberta: The Alpine Club of Canada. 1981.
RACHOWIECKI, Rob. Climbing and Hiking in Ecuador. 1st edition. Cambridge: Bradt Enterprises. 1984.
BRADT, Hillary. Peru and Bolivia: Backpacking and Trekking. 7th edition. Guilford: Bradt Travel Guides Ltd.1998.
KRAKAUER, John. Sobre Homens e Montanhas. 1ª edição. São Paulo: Companhia das Letras. 1999.
SECOR, R.J. Aconcagua, a Climbing Guide. 2nd edition. Washington: The Mountaineers Books. 1999.
BRAIN, Yosi. Ecuador: a Climbing Guide. 1st edition. Washington: The Mountaineering Books. 2000.
COLORADO, Joaquín. Montañismo y Trekking: Manual Completo.1ª edición. Madrid: Ediciónes Desnível. 2001.
KUNSTAETTER, Robert & Daisy. Trekking in Ecuador.1st edition. Washington: The Mountaineers Books. 2002.
RACHOWIECKI, Rob, e Thurber, Mark. The Bradt Climbing and Hiking Guide. 5th edition. Guilford: Bradt Travel Guides Ltd. 2004.

sábado, 16 de outubro de 2010

A Montanha




Subo a montanha
Pontilhada de perguntas
Sei que de cima
Verei o que vivi
Porque experimentei o mundo
Antes de vê-lo de longe.
A montanha se move e lateja;
Pulsa a minha alma
Cravada de dúvidas
Que um dia foram certezas.
Eu sou a minha própria montanha.

Foto: Ivam Melo

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Travessia Petrópolis-Teresópolis



Há muito tempo que eu queria fazer a Travessia Petrópolis-Teresópolis. Clássico do trekking e montanhismo nacional, é considerada a trilha mais bonita do Brasil. Finalmente eu pude matar a vontade.

Fui convidado por alguns amigos do EGB – Espelogrupo de Brasília – e não deixei a oportunidade escapar. O grande conspirador foi o Paulo “Novim” Arenas, que já havia feito a trilha uma vez, mas tinha começado a caminhar muito tarde, de modo que teve um longo segundo dia. Ele também queria mostrar a trilha para a namorada, Flávia Motta, mas durante o passeio revelou sua verdadeira intenção, como vocês verão adiante.

O grupo ainda foi formado por Sílvio Rodrigues, Ana Coelho, Carlos Henrique Castelo Branco, Gabriel Seraphim e Rejane Rosa.

O Planejamento

O planejamento começou por volta do mês de maio de 2010. Escolhemos a data para o feriado de 7 de setembro e no começo de julho compramos as passagens de avião para o RJ por volta de R$ 300,00, valor barato em virtude da compra precoce em relação à data. Também decidimos que pousaríamos no Aeroporto Santos Dumont para facilitar o deslocamento para a Rodoviária Novo Rio, de onde pegaríamos o ônibus para Petrópolis.

Fui pesquisar a melhor forma de chegarmos a Petrópolis, assim como uma boa opção de pousada. Eu queria evitar o atraso que havia acontecido com o Paulo anteriormente. Como a entrada do Parque Nacional da Serra dos Órgãos (www.icmbio.gov.br/parnaso) fica em um bairro afastado de Petrópolis, Corrêas, mais precisamente no final da Estrada do Bonfim, uma subida íngreme de quase 7 Km, seria melhor conseguirmos uma pousada que fosse bem perto da entrada do parque para possibilitar que começássemos a trilha bem cedo e descansados.

Para irmos do aeroporto até a rodoviária, deveríamos pegar o ônibus especial da Linha 2145, Aeroporto Santos Dumont – Aeroporto Internacional do RJ (Galeão). Pesquisando na internet, vi que o micro-ônibus da empresa Real Auto Ônibus custava R$ 12,70. O ônibus para Petrópolis custava R$ 15,98 (www.unica-facil.com.br/linhas_horarios/petropolis_rio.html). A viagem costuma durar 1h30, e os ônibus da empresa que opera esta linha (Única/Fácil) são equipados com poltronas reclináveis e ar condicionado, geladeira, DVD e som ambiente.

Assim, de antemão eu já sabia que nós gastaríamos R$ 28,68 para nos deslocarmos do Santos Dumont até a Rodoviária de Petrópolis. Agora faltava saber como chegar até o Parque.

Como eu disse, a portaria da Sede Petrópolis fica no Bairro do Bonfim, em Corrêas.

Para se chegar de carro, o acesso principal é feito pela BR 040, que liga o Rio de Janeiro (RJ) a Juiz de Fora (MG). Do centro de Petrópolis até a portaria, o acesso é através da Estrada União-Indústria, que margeia o Rio Quitandinha, tomando-se o acesso do bairro (na verdade Distrito) de Corrêas. Para quem vem de Teresópolis o acesso é através da Rodovia BR-393 (Teresópolis-Itaipava). Chegando-se a Itaipava toma-se a direção do Centro de Petrópolis até o Distrito de Corrêas.

A partir de Corrêas deve-se seguir as indicações do Bairro Bonfim. O acesso é feito por estrada de terra e trechos ruins de asfalto e paralelepípedo. A portaria do parque é a última construção na área mais alta do bairro.

De ônibus a melhor opção a partir do Centro de Petrópolis é tomar a linha para Itaipava e saltar na Praça de Corrêas ou no Terminal de Corrêas. De lá existem duas linhas que atendem ao Bonfim - a linha 611 (Bonfim) que tem ponto final a cerca de 1 Km da portaria e a linha 616 (Pinheiral) que chega mais perto, até a Escola Rural do Bonfim. Para isso gastaríamos R$ 2,20 por ônibus. Ou seja, o total para irmos do aeroporto até a entrada do parque seria pelo menos de R$ 30,88, caso não pegássemos nenhum táxi. Um táxi da praça de Corrêas até a entrada do parque custa por volta de R$ 20,00 a R$ 25,00.

As pousadas mais perto do Parque, como a Alcobaça, Paraíso Açu, Vila Açu e Cabanas do Açu, são caras e só estavam aceitando pacotes para o feriado inteiro. Se ficássemos no centro de Petrópolis, poderíamos perder um tempo precioso até chegarmos ao começo da trilha.

Então eu descobri que bem perto da entrada do parque havia um centro de atividades ao ar livre chamado Campo de Aventuras Paraíso Açu. Como era bem ao lado da Pousada Paraíso Açu, deveria ter alguma relação com ela, mas o site era diferente (www.campodeaventurasparaisoacu.com.br), e eu resolvi entrar em contato para ver se lá não haveria algum local para camping, bivaque ou alojamento.



Eles tinham um alojamento para 12 pessoas, mas que na verdade é desconfortável para mais de 8 pessoas, com banheiro e água quente. Iriam nos cobrar R$ 15,00 por pessoa pelo alojamento, R$ 15,00 pelo café da manhã e R$ 20,00 por uma refeição na sexta-feira à noite. Achei um pouco caro, mas compensava, já que poderíamos começar a trilha cedo, começando diretamente na entrada do parque.

Depois resolvi consultar o serviço de uma van. Já que gastaríamos pelo menos R$ 30,88 para chegarmos à pousada, talvez a diferença não fosse muita, pois éramos 8 pessoas.

Consultei várias empresas de turismo do Rio e o melhor orçamento foi da Dica Tours (www.dicatour.com.br), por R$ 335,00 para nos levar do Aeroporto Santos Dumont até a Estrada do Bonfim nº 3.511, com direito a uma paradinha na Casa do Alemão (www.casadoalemao.com.br), tradicional lanchonete do caminho para a Serra, para almoçarmos. Isso dava R$ 41,88 por pessoa. Decidimos que valeria o conforto e a facilidade. Fechamos o pacote por mais R$ 370,00 para sermos levados da Pousada em Teresópolis de volta ao Aeroporto Santos Dumont.

Para a hospedagem em Teresópolis, primeiro tentamos a pousada em que o Paulo tinha ficado da vez anterior. Só que a Pousada Monte Oliveira (www.monteoliveira.kit.net) também só estava fechando pacotes para o feriado completo, e nos recomendaram a pousada Pilar de Teresópolis, Rua Samuel Vieira 47, fones: (21) 3642-2941 e (21) 2643-0842. Eles fecharam a diária por R$ 70,00 por pessoa em quartos duplos.

Para as pousadas pagamos 50% de depósito para a reserva. Para o serviço de van, 20%.

Depois concluí que poderíamos ter voado até o Galeão, já que teríamos o serviço da van, e talvez tivéssemos pagado menos pela passagem de avião.

Nós sabíamos que no segundo dia poderíamos dormir no Abrigo 4, e também sabíamos que um abrigo estava sendo construído ao lado dos Castelos do Açu, local de pernoite do primeiro dia.





Eu entrei em contato com a portaria de Petrópolis e uma moça me disse que não sabia se o Abrigo do Açu já estava operacional, mas que o Abrigo 4 já não era mais controlado pela empresa antiga, e sim pela mesma que teria a concessão de exploração do Abrigo do Açu, e que em alguns dias o site www.parnaso.tur.br estaria funcionando para reserva.

Dois dias depois eu acessei o site e fiz as reservas para 8 pessoas nos dois abrigos (R$ 30,00 + R$ 30,00 por pessoa), as entradas (R$ 10,00 por pessoa) e diárias de montanha (R$ 15,00 + R$ 7,50 + R$ 1,50 por pessoa).

Quando recebi a confirmação do sistema PagSeguro, a descrição da compra só falava em diárias de trilha de montanha e entradas, mas as diárias dos dois primeiros dias incluíam o valor dos abrigos. O Paulo ligou para o parque e descobriu que o responsável da empresa concessionária chamava-se Mariano. Eu liguei para a portaria de Petrópolis e consegui falar com ele. Ele disse que o site não deveria estar funcionando oficialmente. Quem me tinha informado do site tinha cometido um engano, e por isso o PagSeguro não estava bem descrito, e que na verdade o Abrigo do Açu não estava pronto ainda.

Combinamos que eu ligaria pra ele 5 dias antes de viajar para saber se o Abrigo do Açu já estaria funcionando. Se pudéssemos pernoitar nos dois abrigos não precisaríamos levar 4 barracas, 2 ou 3 fogareiros e panelas, mas somente uma barraca, um fogareiro e uma panela para emergência, como no caso de alguém se machucar no segundo dia, já que poderíamos usar as cozinhas e utensílios dos abrigos.

A possibilidade de nos perdermos era remota, já que o Paulo já havia feito a trilha e estaríamos levando dois GPS, mapa e bússola. De qualquer forma, levaríamos sacos aluminizados de emergência, bons agasalhos e sacos de dormir. Caso o abrigo não estivesse pronto, o concessionário nos devolveria o valor correspondente.

Para nos entrosarmos fizemos um treinamento descendo a Chapada da Contagem, subindo o Morro do Quebra Nariz e voltando, num trekking de um dia. Quinze dias depois, fizemos o trekking ao Sertão Zen, pernoitando e voltando.

Poucos dias antes da viagem falamos com o Mariano e ele nos confirmou que realmente o Abrigo do Açu não estaria operacional.

A Viagem

Dia 3 de setembro, sexta-feira, nos encontramos no Aeroporto de Brasília. Chegamos ao Santos Dumont por volta de 10h45 e o motorista já estava nos esperando. Antes de irmos para Petrópolis, guardamos algumas roupas limpas para o vôo de volta no serviço de guarda de bagagens. Eles cobram R$ 10,00 por diária em armários. Caso os armários estejam lotados, é possível guardar as bagagens dentro da salinha do cobrador do serviço por R$ 9,00, R$ 10,00 ou R$ 14,00 por volumes pequenos, médios ou grandes.

Subimos a Serra e almoçamos na Casa do Alemão na entrada de Petrópolis. O Combinado de refrigerante médio, sanduíche de linguiça e croquete estava R$ 12,50. O sanduíche de linguiça com queijo era R$ 10,00, e o chopp R$ 3,50.

Como é proibido transportar as pequenas latas de gás de fogareiros em aviões, pesquisamos e descobrimos que uma loja on-line de venda de equipamentos funcionava a 2,2 Km depois da praça de Corrêas, na Estrada União-Indústria, de modo que poderíamos pedir para o motorista da van passar por lá.

Só que quando ligamos para confirmar a possibilidade de comprarmos o gás pessoalmente, ficamos sabendo que a loja fechava para almoço, exatamente o horário em que chegaríamos lá.

Desse modo fomos direto para o alojamento. Chegamos lá e tentamos ver se seria possível um moto-boy comprar o gás e vir nos entregar, mas acabamos resolvendo pegar uma carona de volta com o motorista da van até a praça de Corrêas e de lá andamos os 2,2 km até a loja, já que havia passado do horário de almoço: Campsite (www.campsite.com.br), Estrada União indústria 2106, logo depois do Hospital Clínico de Corrêas, fone (24) 2221-1045 (não abre aos sábados).

Como teríamos a possibilidade de usarmos a cozinha do Abrigo 4 no segundo dia, levamos somente dois fogareiros, comprando, portanto, somente duas latas de gás por R$ 33,00.

Como ainda era cedo e havíamos marcado a refeição para as 20h00, pegamos um ônibus até o centro de Petrópolis por R$ 2,20 e fomos visitar o Palácio Imperial. Pegamos dois pacotes familiares e cada entrada acabou saindo por R$ 5,00. O Palácio é bonito, mas sentimos que faltava um pouco de individualidade aos aposentos e que grande parte do acervo não era original, mas doações de outras coleções da época. De qualquer forma, o passeio vale à pena e é bem legal deslizar os pés pelo assoalho com as pantufas que somos obriados a usar.



Enquanto a Ana e a Rejane terminavam o passeio eu, o Henrique e o Sílvio bebemos duas latinhas de cerveja Itaipava e depois todos pegamos o ônibus para o distrito de Itaipava, descendo na praça de Corrêas. Tomamos uma cerveja e comemos um pastel num quiosque perto da praça. O pastel, que custava R$ 3,60, revelou-se enorme e nós acabamos depois pedindo que o jantar fosse servido mais tarde. Acabamos pagando R$ 5,00 por pessoa. Os táxi até o alojamento, um para cada 4 pessoas, custaram R$ 20,00 cada um.

Tomamos banho e jantamos. Foi servida uma salada de alface, arroz, estrogonofe de frango e batata palha daquelas de saquinho. Achamos que poderia ter sido melhor, mas comemos bem. As bebidas foram pagas à parte.





Dia 1

Acordamos cedo e comemos bastante, mas o café que foi servido foi apenas razoável. Deixamos o alojamento pouco antes das 08h00 e por volta de 08h20 já havíamos preenchido o Termo de Conhecimento de Riscos na entrada do parque e começamos a caminhar.







Nesse dia subiríamos pouco menos que 1.200 m. A subida do vale do Bonfim começa tranquila. Depois fica mais íngreme, quando começa a ziguezaguear em direção sudeste, subindo até a Pedra do Queijo. Nesse trecho paramos duas vezes para descansar. Da entrada do Parque até a Pedra do Queijo a trilha é toda embaixo de sombra da Mata Atlântica.

Chegamos à Pedra do Queijo por volta das 10h30 depois de cerca de 400 m de subida e paramos para comer e tirar fotos. Encontramos outros caminhantes e batemos papo. Minha água já estava quase no fim, e eu dividi um repositor eletrolítico solúvel com a Rejane.



Agora o caminho não é mais sob árvores altas, mas num campo alto com vegetação mais baixa. Caminhamos mais uns 40 min. até o local conhecido como Ajax, onde há uma pequena fonte de água e um brejinho. Como a próxima etapa seria a mais dura do dia, a Subida da Isabeloca, pegamos água e esperamos passar os 30 min. necessários para que o Clorin purificasse a água antes de começarmos a subida. Nesse trecho eu estava sentindo câimbras na parte interna das coxas e o Paulo me deu um gel de carboidrato que eu dividi com a Ana.



A Subida da Isabeloca é um lance de 500 m de subida dura e íngreme, esburacada e mal manejada com degraus altos. Eu parei várias vezes para recuperar o fôlego e me arrepender de ter levado o peso de tanta comida. Depois de mais de duas horas de subida, paramos para almoçar no final do trecho, num local providencialmente chamado de Graças a Deus.

















O resto do caminho até os Castelos do Açu é em cima da crista do morro, percorrendo ora por cima da rocha, ora por entre o capim alto em direção à Pedra da Cruz, e depois virando à direita até avistarmos o Açu. Visto por esse ângulo, o rochedo do Açu pode parecer tanto um peixe como uma tartaruga.











Montamos nossas barracas na parte Oeste do rochedo, num local com uma bela visão do pôr do sol e com fácil acesso até o banheiro de compostagem (cuja porta está empenada e não fecha). No entanto, poderíamos ter acampado embaixo do rochedo, ficando mais protegidos dos fortes ventos que sopraram durante a noite. A minha barraca Três Estações resistiu bem ao vento, já que tem uma bainha que eu e o Sílvio cobrimos com pedras. A Falcon 2 do Iki chegou a ter alguns espeques arrancados, e o vento a deformava o tempo todo.











Juntamos todos os nossos reservatórios de água numa mochila e o Paulo e o Gabriel foram buscar água na caixa do lado leste do Açu, acima do futuro abrigo. A água vem bem fraquinha e no fim do dia acaba se formando uma longa fila. A água tem uma coloração amarelada e nós a purificamos com cloro, mesmo a água que iríamos ferver para cozinhar.



No lado Leste do Castelo do Açu, há um cabo de aço para ajudar quem quiser subir no rochedo para apreciar o pôr do sol.



Mas o Paulo nos chamou para apreciar o ocaso no lado oeste do acampamento e disse que queria conversar com todos. Quando o Paulo começou a falar, logo percebemos a sua intenção e começamos a tirar fotos antes que ele terminasse o seu pedido de casamento à Flávia. Eles trocaram as alianças e se abraçaram apaixonadamente. Todos nós ficamos emocionados.









O que seria uma comum refeição de acampamento então se revelou um jantar de noivado. Aproveitei para aliviar o peso da minha mochila e todos nós compartilhamos nossas refeições. Alguns de nós tínhamos levado refeições liofilizadas da Liofoods (www.liofoods.com.br). Algumas destas refeições estavam boas, outras nem tanto. Concluímos que o problema básico da Liofoods deve ser o cozinheiro, mas farei uma crítica mais apurada numa postagem futura exclusiva para o assunto.

Dia 2

Eu acordei bem cedo para não pegar fila no banheiro. Desmontamos nossas barracas, arrumamos nossas mochilas e tomamos café.



Eu comi uma porção de ovos à grega liofilizada e um kit café-da-manhã da Liofoods. Na verdade, a única coisa liofilizada nesse kit são as rodelas de banana. O resto são seis creamcrackers que acabaram todos quebrados, leite e achocolatado em pó, um potinho de geléia, um saquinho pequenininho de mel e um saquinho de açúcar. Eu misturei o achocolatado e o leite com água quente e acrescentei a banana. Acabei ficando cheio e não comi nenhum carboidrato. Mais tarde me senti meio fraco, provavelmente por isso.

Passamos pelo rochedo e pelo Abrigo e vimos que ele estava ocupado. Perguntamos às pessoas que estavam lá dentro e eles disseram ser do Parque, mas não tinham nenhuma identificação. Ficamos meio putos e tiramos fotos caso quiséssemos entrar depois com uma ação judicial contra a concessionária, pois mesmo tendo pago pelo abrigo, não fomos autorizados a ficar lá com o alegado motivo de que ele não estava operacional, mas outras pessoas o estavam usando.











Começamos a descer o vale que precede o Morro do Marco por um trecho meio exposto de rocha inclinada, por isso fomos devagar, apreciando o visual do vale.

Depois de uma rápida subida paramos brevemente para descansar no topo do morro, de onde podíamos apreciar o Dedo de Deus. Descemos em direção ao vale do Rio Sossego, onde abasteceríamos os reservatórios de água que tinham somente o que havia sobrado da noite anterior e do café da manhã.











Nessa descida foi que comecei a me sentir meio fraco. Chegando no rio eu comi parte dos sanduíches de salaminho e queijo provolone que fariam parte das minha alimentação do dia e recuperei as forças. Enchemos nossos cantis e eu comecei a subir antes dos outros seguido pelo Sílvio, indo bem devagar. A subida lente e constante rendeu muito mais do que as subidas mais rápidas acompanhadas de várias paradas de descanso.

No topo do Morro da Luva começamos a ver a cerração que se aproximava, e temíamos que aquela neblina pudesse representar uma frente fria que trouxesse mais nuvens e chuva, o que dificultaria o trajeto. No entanto, a neblina vinha e voltava rapidamente trazendo apenas um pouco de umidade.









Saindo do Morro da Luva seguimos a orientação do tracklog, que era diferente do caminho que as outras pessoas estavam seguindo. Acabamos pegando um caminho errado e, em vez de voltarmos para pegar a trilha onde todos estavam indo, resolvemos cortar o mato, o que acabou sendo mais difícil do que se tivéssemos voltado pelo mesmo caminho e corrigido o erro desde o topo do Morro da Luva.

Tomamos a trilha certa que cortava um trecho de rocha e ia descendo até um pequeno vale. Primeiro encontramos um par de corrimões e depois uma pequena ponte cruzando a depressão onde deveria haver um rio nas épocas mais chuvosas. Essa ponte precede o Elevador.

O Elevador é uma subida íngreme na rocha onde foram instalados cerca de 80 vergalhões de ferro que servem como escada. A subida não é tão dura quanto parece e há três pontos onde se pode parar e descansar com segurança. A saída, que antes, segundo o Paulo, era bem exposta, agora também foi preenchida com mais alguns degraus.













Chegamos no topo do Morro do Elevador, também conhecido como Dinossauro, às 13h00 e paramos para comer. De lá, olhando para o leste, tínhamos a bela visão da rocha do Garrafão à direita e do grande paredão rochoso que culmina com a Pedra do Sino. Entre eles a via Terra de Gigantes, mais técnica via de escalada brasileira, aberta por Sérgio Tartari e Alexandre Portela em 1987, e depois repetida uma única vez por Sérgio Tartari, Eliseu Frechou e Márcio Bruno em 1998. Essa repetição foi documentada no filme Terra de Gigantes, que pode ser comprado e cujo trailer você pode assistir no site www.mountainvoices.com.br .

http://espnbrasil.terra.com.br/eliseufrechou/post/114557_PIZZA+E+ESCALADA+COM+SERGIO+TARTARI+II

A primeira coisa que pensamos quando avistamos essa grande parede rochosa com a Pedra do Sino à esquerda foi “- O quê? Temos que chegar ali? Vai ser duro...”. Mas é mais fácil do que parece.



Quando iniciamos a descida para o Vale das Antas a neblina tomou conta da face rochosa da montanha, bem no lugar que tínhamos que cruzar para chegar ao acesso para a várzea. Por sorte tínhamos encontrado um grupo que estava sendo conduzido pelos guias Gláucio (http://glaucioagarras.com ) e Efraim, que nos deram boas dicas sobre a descida.



Você tem que ir contornando a rocha suavemente em direção norte por uma breve trilha no mato. Quando encontrar a rocha deve-se seguir para nordeste até uma selada, pisando bem devagar para não escorregar. De lá tomamos o rumo sudeste até chegarmos à beira do precipício com uma diferente visão do vale abaixo, mas somente passamos por lá sem apreciar a visão e preferimos seguir o grupo que estava com os guias.

Essa decisão foi crucial para pegarmos o caminho certo, pois a descida até o vale das Antas é duro. Muitos temem mais as subidas, pois são mais extenuantes. Entretanto, as descidas castigam mais as juntas (quadril, joelho e tornozelo). Quando são, como na descida do Vale das Antas, íngremes e com degraus altos de rocha coberta por uma fina camada de terra, podem ser escorregadias e dificultam o equilíbrio com a mochila cargueira, demandando uma grande energia.

Nesse ponto, e depois mais adiante, eu pude testemunhar a ética dos dois guias. Eles estavam guiando um grupo de oito a doze pessoas, e nós estávamos na verdade andando no mesmo ritmo que o grupo deles. Mas, mesmo sendo guias que estavam sendo pagos por seus clientes, fizeram questão de nos indicar os melhores caminhos. No final da descida do Vale das Antas, se seguíssemos a trilha mais evidente, acabaríamos tendo que cruzar um trecho de mato alto, mas fomos avisados pelo Efraim que seria mais fácil seguirmos a trilha menos marcada, à direita da descida.

Todos nos reabastecemos de água na fonte no Vale das Antas. O vale estava coberto por uma neblina densa que inicialmente nos refrescou. Esperamos a meia hora regimental para que a água fosse purificada enquanto comíamos e descansávamos. Na verdade estávamos ansiosos, pois a próxima etapa seria a mais dura da Travessia.

Cruzamos a pequena ponte sobre o rio e começamos a subir, saindo do vale. Caminhamos lentamente, cruzando por ente bromélias, seguindo em direção ao Morro da Baleia.





Saindo do Morro da Baleia, chegamos ao local mais impressionante da Travessia. Estávamos acima do Vale dos Sete Ecos, onde a voz gritada se repete sete vezes. Do outro lado do Vale víamos um grupo subindo a Pedra do Sino pela sua jugular esquerda, parecendo impressionantemente longe.





A neblina vinha nos abraçar brevemente como um bom presságio e logo depois se dissipava. Enquanto o Paulo e o Gabriel montavam o corrimão para a descida do Mergulho, um dos trechos mais técnicos da Travessia, admirávamos o efeito da luz do sol sobre o vapor d’água nos desenhando um belo arco-íris branco.

Com a ajuda do Gláucio, descemos o Mergulho. Deixamos o corrimão para ser usado pelo grupo dele e começamos a subir a Pedra do Sino. O que parecia ser um trecho longo foi percorrido rapidamente e num instante já estávamos no Cavalinho.

O Cavalinho é um trecho com breves movimentos de escalada simples, mas que, por ser num trecho meio exposto, pode causar tensão. Na verdade, quando avistei a famosa rocha, achei que presencialmente era bem maior do que aquela que aparecia em fotos pesquisadas pela internet e nos vídeos do Youtube.

Houve uma grande pressão por parte dos condutores comerciais no sentido de se montar uma escada ali, de modo a facilitar e tornar o trecho mais seguro. O assunto foi amplamente discutido na Câmara Técnica de Montanhismo e Turismo do parque, e a conclusão foi de que o lance era uma dificuldade natural da trilha, sem desgastes ou erosão que justificassem uma intervenção. A única concessão foi a manutenção de um grampo P no topo do lance, permitindo ao guia dar segurança aos seus participantes. Assim, o tradicional lance do Cavalinho foi mantido na sua forma natural, o que foi bastante comemorado pelos montanhistas.

O Gabriel foi o primeiro a cruzar, seguido pela Rejane. Nós todos passamos primeiro as mochilas para cima. Eu fui em seguida, acompanhado pelo Sílvio, pelo Iki, a Ana e a Flávia. O Paulo foi o último.











Poucos passos depois do Cavalinho há mais um trecho com uma pequena escalada com agarras à direita e outro trecho alto com uma providencial escada de ferro, instalada por Endre de Gyalokay.

Nesse grotão o solo arenoso estava se desfazendo. O terreno, desprovido de rocha, não suportava o tráfego dos caminhantes e estava se erodindo. Engenheiro mecânico, escalador e guia do Centro Excursionista Petropolitano desde os anos 1960 e ainda em atividade, Endre projetou a escada e a levou sozinho até o local, fazendo a fixação no dia seguinte. Depois disso a trilha é fácil e se bifurca em dois caminhos: um para o topo a Pedra do Sino, outro para o Abrigo 4.



Nós havíamos perdido certo tempo no Cavalinho e no trecho de escalada seguinte, e por isso seguimos direto para o Abrigo.



Chegando lá, causamos certo alvoroço para usar o banheiro e tomar banho. Como éramos 8 pessoas, congestionamos o processo de recolher água no ribeirão perto do abrigo e de esquentar água para o banho de latinha, já que o banheiro estava sem água.

O Abrigo tem dois quartos com 4 beliches cada um e dois banheiros. No andar de cima fica o alojamento dos funcionários e um quarto para bivaque no chão. Quem fica no abrigo pode usar o fogão e as panelas da cozinha.

Depois de nos instalarmos nos quartos nos cumprimentamos, nos felicitando mutuamente pelas conquistas do dia, felizes por termos vencido os trechos mais difíceis da Travessia.

Encontramos o Mariano, que se comprometeu a depositar durante a semana os R$ 240,00 da reserva do Abrigo do Açu, mais R$ 80 da diferença da diária do Abrigo 4, que era de R$ 20,00 e não de R$ 30,00.

Comemos bem e depois conversamos bastante até as 22h00, hora em que se deve fazer silêncio no abrigo em respeito aos outros usuários.

Dia 3

No dia seguinte acordamos um pouco mais tarde e fomos informados de que estava chovendo em Teresópolis, de modo que decidimos esperar um pouco mais pra sair numa hora mais quente. Tomamos nosso café, arrumamos as mochilas e alongamos antes de sairmos exatamente às 11h00.











Antes de começarmos a trilha, o Paulo fez uma pequena bandeirinha pirata num pedaço de papel, já que desde o começo da trilha nós nos autodenominávamos "Os Piratas".



O terceiro dia de trilha começa com um caminho fácil que desce suavemente. Passamos pelas ruínas do Abrigo 3 e eu comentei como a trilha era mal manejada e poderia ser melhor cuidada. Estávamos andando rápido, num ritmo forte, já que estávamos ansiosos em chegar a Teresópolis e com uma boa desenvoltura, bem juntos numa fila indiana. O Paulo carregava sua bandeira de pirata e todos reclamavam por eu ser o único que ainda não tinha ganhado um apelido na trilha. Parecendo uma premonição, eu disse que achava que algo iria acontecer naquele dia que iria me render um apelido.

Eu estava caminhando olhando para o chão. De repente eu bati a cabeça em um grosso galho de árvore que deveria ter sido retirado caso a trilha fosse bem manejada. Como estava num ritmo forte, na hora que eu bati, tudo ficou escuro e eu vi estrelas. Pedi para parar para recobrar o equilíbrio e meus amigos me avisaram que eu havia cortado o supercílio, que estava sangrando.















O corte foi de cerca de 1,5 cm, e uma boa camada de derme e epiderme ficou exposta. Não por sorte, tínhamos um bom kit de Primeiros Socorros. A Rejane colocou as luvas cirúrgicas, lavou o ferimento e empurrou a parte exposta para dentro, fechando bem o corte. Para evitar que eu piscasse e voltasse a abrir o machucado, ela me colocou um adesivo tapa olho. Nós já nos autodenominávamos Os Piratas. Como eu disse, naquele dia, o Paulo carregava uma bandeirinha pirata desenhada num pedaço de papel, e eu acabei personificando o nosso título, exatamente como eu havia previsto.

Caminhar com um olho só é mais difícil do que parece, pois perdemos muito a noção de profundidade. Tivemos que diminuir bastante o ritmo e eu era ajudado o tempo todo pelo Iki, que seguia na minha frente, e pelo Sílvio e pelo Gabriel, que vinham depois. Em pouco tempo eu já estava caminhando com mais desenvoltura, mas ainda num ritmo bem mais lento.

Passamos por um grupo bem mais vagaroso que nós em decorrência de uma caminhante que tinha torcido o pé. Passamos também por uma pequena gruta e paramos para descansar depois de um riozinho.





Já estávamos ansiosos para chegarmos logo. O caminho foi ficando um pouco mais difícil em virtude do grande número de pedras no chão. Depois de cruzarmos três pequenas pontes, começou uma chuva fina e nós passamos pela Cachoeira Véu de Noiva. A partir daí as pedras molhadas demandavam atenção dobrada, mas em menos de uma hora chegamos à barragem que marcava o fim da Travessia, totalizando 5 horas de percurso.



Tomamos algumas latinhas de cervejas que eram vendidas por um ambulante e tiramos a foto do fim da trilha. Eu fui até o espelho retrovisor de um carro e vi que o corte realmente parecia precisar de um ponto. Um guarda-parque nos chamou um táxi e eu e a Rejane fomos para o Hospital São José, parando antes na pousada para deixarmos nossas coisas. O pessoal da pousada já estava preocupado com a nossa demora e ficaram felizes em nos ver.

No hospital eu fui atendido prontamente. Um enfermeiro meio grosso me deu uma dolorosa injeção antitetânica. O médico me deu apenas um ponto, mas pediu radiografia. Eu expliquei pra ele que achava que não era necessário. Esclarecemos melhor a história da batida, pois ele tinha entendido que eu estava fazendo uma trilha de moto, e não a pé, de modo que dispensou a radiografia.

Voltamos para a pousada onde nossos amigos ou tomavam cerveja ou recebiam massagem de uma massagista chamada pela Ágata, responsável pela pousada. Depois de tomarmos banho, fomos até a praça do bairro Alto e comemoramos com um belo jantar na churrascaria Novilho de Ouro. Dormimos o sono dos justos.



No dia seguinte, após um belo café da manhã, fomos a uma Lan House para copiarmos todas as fotos das 5 câmeras, menos a do Paulo, cujo cartão era muito grande e estava sem adaptador. Procuramos ainda por uma camiseta ou patch da travessia pela praça e pelo shopping. Não encontramos e voltamos para a pousada.

Chegando lá a van já estava nos esperando. Voltamos para o Aeroporto, onde deixamos as mochilas no serviço de guarda de bagagem e fomos almoçar num bom restaurante em Botafogo. Depois do almoço, fizemos hora num barzinho, o Zuzu Goró, e por volta das 17h30 voltamos ao Aeroporto, de onde finalmente fomos pra casa.

O mais importante de uma atividade como essa é compartilhar as experiências com os amigos. Nenhuma paisagem seria tão bonita se não tivéssemos com quem dividir o momento. Fomos um grupo unido, onde todos se ajudaram mutuamente. Aproximamo-nos e nos marcamos indelevelmente. Foi preciso um duro ambiente externo para alcançar esse estado de espírito, mas o companheirismo e as dificuldades superadas ficarão eternamente tatuados nos nossos corações.

Boas trilhas,

Bulha


Os Piratas:

Ana “Aninha Terremoto” Coelho

Carlos Henrique “Iki Deitadinha” Castelo Branco

Flávia “Cai-Cai” Motta

Gabriel “Dubi Dubi” Seraphim

Paulo “Noivim” Arenas

Rejane "Malvadeza" Rosa

Rodrigo “Bilha, O Pirata” Bulhões

Sílvio “Sílvio Santos” Rodrigues

Todas as fotos nessa postagem foram tiradas pelos integrantes do grupo.